sexta-feira, 11 de abril de 2008

Preconceito cego

Em minha rua morava João
Era cego de nascença
Por isso desenvolveu desde cedo a audição
Surpreendia a todos com sua habilidade
Reconhecia o ônibus pelo som do freio
Reconhecia os carros pelo som do motor
Nunca errava, era impressionante
Além disso, era muito simpático
Extrovertido, era um ícone para garotada
Adorava conversar sobre futebol
E nós adorávamos explicar-lhe os lances
O modo como o pé bateu na bola
As jogadas que originaram os gols do Vitória
Ele se amarrava quando armávamos um baba
Morria de rir enquanto jogávamos
Participava ao seu modo
Demonstrava uma pureza até então desconhecida
Certa feita, não lembro exatamente a ocasião
Alguém comentou:
João é mais preto do que eu!
E João, instantaneamente, retrucou:
Eu não sou preto não! Eu sou branco!
A sua resposta fez com que ríssemos sem parar
Pensamos: esse cego é doido! Branco?!
E ele reiteirou sua afirmação, convicto
Fiquei pasmo, porque ele era negro
Filho de negros, sua avó era negra
E também pelo fato dele ser cego
Perguntei-me:
Que tipo de comentário é este?
Ele não sabia sua cor?
Não se aceitava negro?
O que ser negro representava para ele?
Alguém iludia o garoto cego?
Passados alguns dias, aquilo ainda me ocupava
João pensa ser branco!
Então tive uma idéia da origem do seu engano
Para João, deveria ser suficientemente difícil ser cego
Sofria discriminação, privações e limitações demais
Preferia, então, pensar ser branco
Já que estes, em sua cabeça,
São vistos com bons olhos

3 comentários:

Pablo disse...

sujeito a alteraçoes é difude!
eu também as vezes tenho vontade de publicar coisas que eu nao sei se estão prontas, masde repente eu tenho a sensação de modificar tudo que eu ja fiz, não encontro nenhuma obra acabada, como um quadro, e desisto de diferenciar as mais aparentemente completas das menos.
Gostei da poesia, é baseada em fatos reais ou imaginação.
Abr´ço, queria ler mais...

Pablo disse...

imaginaçao?

Unknown disse...

imaginação!